Aprendizagens e reflexões que trouxemos do Encontro Internacional de Educação Midiática para a Democracia e Equidade Social
Nos dias de hoje, não é possível falar em educação e ignorar que vivemos em uma época em que somos bombardeados o tempo todo por informações de todos os tipos, formatos e qualidades. Os novos formatos de conteúdos, que surgem a cada dia, inauguram novas leituras e narrativas sobre o mundo. Todas essas mudanças demandam uma nova perspectiva de educação que não considere a comunicação como um fenômeno à parte do mundo que ensinamos, mas que a entenda como parte orgânica deste mesmo mundo, atuando na sua representação e construção.
A educação midiática preenche esta lacuna, nos munindo de recursos para aprender e ensinar a acessar, analisar, criar e participar do universo informacional que permeia todas as áreas da nossa vida e a de nossos estudantes. Pensando em debater o presente e o futuro da educação midiática do Brasil e no mundo, na última semana, profissionais, estudantes e pesquisadores de educação e comunicação se reuniram no Encontro Internacional de Educação Midiática para a Democracia e Equidade Social. O evento, realizado pelo Instituto Palavra Aberta, em parceria com o curso de jornalismo da ESPM e a Embaixada e Consulados dos EUA no Brasil, mostrou o quanto já avançamos nas discussões em educação midiática nos últimos anos, principalmente após o início do programa EducaMídia, em 2019.
Além do encontro gratuito e aberto ao público, que envolveu mais de duas mil pessoas, entre participantes presenciais e remotos, facilitadores do programa EducaMídia e parceiros, como a Amplifica, participaram de uma imersão com autoridades internacionais no assunto, como a professora Renee Hobbs (Media Education Lab – EUA), Michelle Cullia Lipkin (National Association for Media Literacy Education – EUA) e Paolo Celot (Media Literacy for Active Citizenship-EAVI). Reunimos aqui quatro pontos que resumem os principais insights desses dois dias de reflexão, que nos deixam uma chamada urgente à ação.
A relação entre a comunicação e a educação
A educação e a comunicação sempre andaram de mãos dadas. Ambas as práticas têm como valor fulcral o empoderamento a partir do conhecimento, para que possamos tomar decisões de forma crítica e participar ativamente da democracia. Sem jornalismo e sem educação não há democracia. Não há mais como separar o virtual do real, como se fossem mundos distintos. A internet é um território que temos o direito de ocupar, e precisamos fazê-lo com responsabilidade e consciência.
A educação midiática atua na promoção dos direitos, da democracia e da cidadania, na medida em que ensina de que forma a mídia atua na construção da realidade, moldando nossa compreensão sobre a sociedade. Ao combater a desinformação e promover a leitura crítica e o letramento informacional, potencializa a voz de grupos vulnerabilizados e ensina-os a utilizar os espaços digitais em direção a uma cultura de paz e de bem viver.
A educação midiática no ambiente escolar
A educação midiática não deve ser tratada como uma nova disciplina ou um conteúdo à parte das componentes curriculares já trabalhadas na educação básica. Ela não é limitada aos professores de linguagens, mas pode e deve permear todas as áreas do conhecimento, pois concentra-se na forma como ensinamos, e não necessariamente no conteúdo. É uma perspectiva pedagógica que não se limita ao uso de peças midiáticas em sala de aula, mas na promoção da análise crítica e na produção consciente de conteúdos, que considere a voz e a perspectiva dos estudantes.
Não requer estruturas muito complexas, mas passa pela conscientização de gestores de sua importância, para que invistam na formação de professores e incentivem práticas pedagógicas que promovam o letramento midiático de crianças e adolescentes, envolvendo também as famílias, para que a educação midiática seja sustentável e permanente.
A educação midiática está prevista na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) em sua competência geral 5, e também no documento complementar da BNCC da Computação, e permeia outros documentos normativos oficiais, como o Plano Nacional de Educação Digital. Portanto, não se trata de um diferencial trazer a educação midiática para as escolas, mas de uma necessidade e um compromisso cívico das instituições de ensino com a manutenção de uma educação de qualidade.
A educação midiática como assunto global
“É preciso uma comunidade para educar uma criança”. O provérbio, relembrado durante o encontro por Alexandre Sayad, diretor da ZeitGeist e co-chairman da aliança internacional da Unesco em educação midiática, traz à tona a relevância do envolvimento de toda a comunidade nas ações em letramento midiático de nossas crianças e adolescentes, e a importância de entender a realidade local para a definição destas ações.
Então, embora este seja um tema discutido globalmente, é fundamental um olhar localizado, atento às demandas e particularidades de cada região e, principalmente, que envolva diversos setores da comunidade, incluindo espaços formais e informais de educação. E isso passa, também, pela reformulação de índices de qualidade e estratégias em educação midiática, que devem ser pensadas com educadores e pesquisadores brasileiros, que muito têm a contribuir com os avanços já realizados por estudiosos internacionais.
A importância das pessoas
O professor Paolo Celot, da Media Literacy for Active Citizenship-EAVI, ressaltou, ao longo do encontro, que as pessoas são o ativo mais importante de qualquer organização ou comunidade. Por isso, a educação midiática atua no resgate da humanidade em uma sociedade cada vez mais inundada por algoritmos, dados e recursos digitais. Ela nos permite tomar consciência de como nossas emoções funcionam e, desta forma, não seremos alvos fáceis dos algoritmos e seus padrões obscuros.
Nós, seres humanos, somos os únicos capazes de aprender a aprender. E é esta competência que a educação midiática nos convida a mobilizar: lifelong learning, o constante aprendizado que nos move, nos torna humanos e nos une. A educação midiática nos convoca à ação. E, pegando emprestado os “6 quês” do jornalismo, sugiro um paralelo:
Quem? Todos nós! Gestores (nacionais, regionais, locais, escolares), professores (de todas as áreas), estudantes, família e comunidade.
Como? Aprendendo a acessar, analisar, criar e participar de forma crítica da nossa sociedade, utilizando a mídia não só como instrumento, mas como objeto de reflexão e ação.
Quando? Agora! Já! Não podemos adiar o presente!
Onde? A começar pela sua sala de aula.
Por quê? Porque não temos álibi. Precisamos assumir nossa responsabilidade como educadores, comunicadores e pesquisadores, em direção a uma sociedade mais justa, democrática e igualitária.